sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Zé apreciador de canto e viola!*


Faleceu Zé simplesmente, ou simplesmente faleceu Zé.

Com duas letras apenas Deus pôs nome ao mais simples dos mortais.

Morreu menos que ninguém, pois ninguém é menos que Zé.

Morreu Zé, e ainda por cima Pirento - Zé Pirento.

Um substantivo e um adjetivo perfaziam todo seu ser no mundo.

Um Zé brasileiro nato, daqueles que têm de tudo um pouco

um pouco de dinheiro no bolso, um pouco de amigos, um pouco de comida no prato,

um pouco de alegria, um pouco de tristeza, um pouco de amor, um pouco de leveza, um pouco de esperteza, um time pra torcer e um pouco de esperança que ele seja o próximo campeão brasileiro.

Como veio, se foi: Zé, Zé filho do Lessa. Que Lessa? Do Lessa da prefeitura.

Dessa não!, de antigamente, pai do Ronaldo, irmão da Cidalgina,

irmã do Zé, que morou em Campo Grande, onde conhecemos o Zé Pirento,

o Zé conselheiro, o Zé companheiro, o Zé amigo, o Zé da farra, o Zé segura-barra, o Zé agitador cultural, o Zé cicerone, o Zé fiscal da prefeitura, o Zé da vida dura, o Zé da pinga, o Zé da viola, o Zé do consolo de quem chora, o Zé da vila, o Zé da lida, o Zé da vida, o Zé do relento, o Zé da pira, o Zé da fila, o Zé Pirento.

Era apenas Zé, mas era muitos, hein?!

Era apenas Zé, mas era nosso.

Apenas Zé, e era tantos. Quantos??? Não sei, só sei que era tantos quantas foram as vezes que precisamos dele. Tantos quanto os muitos para quem ele simplesmente estendeu sua mão amiga e despretenciosa; tantos quanto os muitos Zés com que convivemos em terras distantes.

Na simplicidade de ser apenas Zé habitava o mistério da sua multiplicidade e a grandeza de ser uno sendo vários, de ser único sendo todos os zés do mundo num só coração dadivoso e solidário.

Para nos ensinar que a vida é só um sonho, Zé morreu dormindo.

Indo em silêncio nos poupou do constrangimento da despedida.

Viveu intensamente a vida para nos mostrar o quanto ela vale.

Foi solidário o quanto pôde para nos ensinar que é sempre possível sermos melhores do que somos.

Partiu tão-somente Zé para nos dizer que a morte não passa de um monossílabo átono e que ele, em tendo por nome um monossílabo tônico, a ela se apresentou assim apenas para morrer com um mínimo de dignidade prosódica – o máximo de soberba a que se permitiu em vida.

Adeus, Zé!

Por mim e pelo Mano Velho, Miguel, que madrugadas inteiras e incontáveis colocou seu coração, sua voz e seu talento à disposição do diapasão existencial do Zé Lessa, sensível apreciador de canto e viola.


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* Texto e foto por Antonio Serpa do Amaral Filho (Basinho)

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